E assim vai Portugal!........Relato de uma professora...........
Dia vinte e seis de Março de 2010. Último dia de aulas. Às 14 horas
dirigi-me à sala 15 no Pavilhão A para dar a aula de Área de Integração à turma
10º DG do Curso Profissional de Design Gráfico. Propus aos alunos a ida à
exposição no Polivalente e à Feira do Livro, actividades a decorrer no âmbito
dos dias da ESE. A grande maioria dos elementos da turma concordou, com
excepção de três ou quatro elementos que queriam permanecer dentro da sala de
aula sozinhos. Deixar que os alunos fiquem sozinhos na sala de aula sem a
presença do professor é algo que não está previsto no Regulamento Interno da
Escola pelo que, perante a resistência dos alunos que não manifestavam qualquer
interesse nas actividades supracitadas decidi que ficaríamos todos na sala com
a seguinte tarefa: cada aluno deveria produzir um texto subordinado ao tema
"A socialização" o qual me deveria ser entregue no final da aula.
Será preciso dizer qual a reacção dos alunos? Apenas poderei afirmar que os
alunos desta turma resistem sempre pela negativa a qualquer trabalho porque a
escola é, na sua perspectiva, um espaço de divertimento mais do que um espaço
de trabalho. Digamos que é uma Escola a fingir onde TUDO É PERMITIDO!
É muito fácil não ter problemas com os alunos. Basta concordar com eles e
obedecer aos seus caprichos. Esta não é, para mim, uma solução apaziguadora do
meu estado de espírito. Antes pelo contrário. A seriedade é uma bússola que
sempre me orientou mas tenho que confessar, não raras vezes, sinto imensas
dificuldades em estimular o apetite pelo saber a alunos que têm por este um
desprezo absoluto. As generalizações são abusivas. Neste caso, não se trata de
uma generalização abusiva mas de uma verdade inquestionável. Permitam-me um
desabafo: os Cursos Profissionais são o maior embuste da actual Política
Educativa. Acabar com estes cursos? Não me parece a solução. Alterem-se as
regras.
Factos
ocorridos na sala de aula:
Primeiro
Facto: Dei início à aula não sem antes solicitar aos
alunos que se acomodassem nos seus lugares. Todos o fizeram exceptuando o aluno
***********, que fez questão de se sentar em cima da mesa com a intenção
manifesta de boicotar a aula e de desafiar a autoridade da professora.
Dei ordem ao aluno para que se sentasse devidamente e este fez questão de
que eu o olhasse com atenção para verificar que ele, ***********, já estava
efectivamente sentado e ainda que eu não concordasse com a sua forma peculiar
de se sentar no contexto de sala de aula, seria assim que ele continuaria:
sentado em cima da mesa. Por três vezes insisti para que o aluno se acomodasse
correctamente e por três vezes o aluno resistiu a esta ordem.
Reacção da maioria dos elementos da turma: Risada geral.
Reacção do aluno *********: Olhar de agradecimento dirigido aos colegas
porque afinal a sua "ousadia" foi reconhecida e aplaudida.
Reacção da professora: sensação de impotência e quebra súbita da
auto-estima.
Senti este primeiro momento de desautorização como uma forma que o aluno,
instalado na sua arrogância, encontrou de me tentar humilhar para não se sentir
humilhado.
Como diria Gandhi, "O que mais me impressiona nos fracos, é que eles
precisam de humilhar os outros, para se sentirem fortes..."
Saliento que neste primeiro momento da aula a humilhação não me
atingiu a alma embora essa fosse manifestamente a intenção do aluno.
Segundo Facto: Dei ordem de
expulsão da sala de aula ao aluno **********, com falta disciplinar. O aluno
recusou sair da sala e manteve-se sentado em cima da mesa com uma postura de
"herói" que nenhum professor tem o direito de derrubar sob pena de
ter que assumir as consequências físicas que a imposição da sua autoridade
poderá acarretar.
Nem sempre um
professor age ou reage da forma mais correcta quando é confrontado com
situações de indisciplina na sala de aula. Deveria eu saber fazê-lo? Talvez!
Afinal, a normalização da indisciplina é um facto que ninguém poderá negar.
Deveria ter chamado o Director da Escola para expulsar o aluno da sala de aula?
Talvez...mas não o fiz. Tenho a certeza de que se tivesse sido essa a minha
opção a minha fragilidade ficaria mais exposta e doravante a minha autoridade
ficaria arruinada.
Dirigi-me ao aluno
e conduzi-o eu própria, pelo braço, até à porta para que abandonasse a sala. O
aluno afastou-me com violência e fez questão de se despedir de uma forma
tremendamente singular: colocou os seus dedos na boca e em jeito de despedida
absolutamente desprezível, atirou-me um beijo que fez questão de me acertar na
face com a palma da mão. Dito de uma forma muito simples e SEM VERGONHA: Fui
vítima de agressão. Pela primeira vez em aproximadamente vinte anos de serviço.
Intensidade Física
da agressão: Média (sem marcas).
Intensidade
Psicológica e Moral da agressão: Muito Forte.
Reacção dos
alunos: Riso Nervoso.
Reacção do aluno
**********: Ódio visível no olhar.
Reacção da
professora: Humilhação.
Ainda que eu saiba
que a humilhação é fruto da arrogância e que os arrogantes nada
mais são do que pessoas com complexos de inferioridade que usam a humilhação
para não serem humilhados, o que eu senti no momento da agressão foi uma
espécie de visita tão incómoda quanto desesperante. Acreditem: a visita da
humilhação não é nada agradável e só quem já a sentiu na alma pode compreender
a minha linguagem.
Terceiro Facto: O aluno preparava-se
para fugir da sala depois de me ter agredido e, conforme o Regulamento Interno
determina, todos os alunos que são expulsos da sala de aula terão que ser
conduzidos até ao GAAF, Gabinete de Apoio ao Aluno e à Família. Para o efeito,
chamei, sem êxito, a funcionária do Pavilhão A, que não me conseguiu ouvir por
se encontrar no rés-do-chão. Enquanto tal, não larguei o aluno para que ele não
fugisse da escola (embora lhe fosse difícil fazê-lo porque os portões da escola
estão fechados).
Mais uma vez, o
aluno agrediu-me, desta vez, com maior violência, sacudindo-me os braços para
se libertar e depois de conseguir o seu objectivo, começou a imitar os
movimentos típicos de um pugilista para me intimidar. Esta situação ocorreu já
fora da sala de aula, no corredor do último piso do Pavilhão A.
Reacção dos alunos
(que entretanto saíram da sala para assistir à cena lamentável de humilhação de
uma professora no exercício das suas funções): Risada geral.
Reacção do aluno
********: Entregou-se à funcionária que entretanto se apercebeu da ocorrência.
Reacção da
Professora: Revolta e Dor contidas que só o olhar de um aluno mais atento ou
mais sensível conseguiria descodificar. Porque, acreditem: dei a aula no tempo
que me restou com uma máscara de coragem que só caiu quando a aula terminou e
sem que nenhum aluno se apercebesse. Entretanto, a funcionária bateu à porta
para me informar que o aluno queria entrar na aula para me pedir desculpa pelo
seu comportamento "exemplar".
Diz-se que um
pedido de desculpas engrandece as partes: quem o pede e quem o aceita. Não
aceitei este pedido por considerar que, fazendo-o, estaria a pactuar com um
sistema em que os professores são constantemente diabolizados,
desprestigiados e ameaçados na sua integridade física e moral. Em última
análise, a liberdade não se aliena. O aluno escolheu o seu comportamento. O
aluno deverá assumir as consequências do comportamento que escolheu e deverá
responder por ele. É preciso PUNIR quem deve ser punido. E punir em
conformidade com a gravidade de cada situação. A situação relatada é muito
grave e deverá ser punida severamente. Sou suspeita por estar a propor uma pena
severa? Não! Estou simplesmente a pedir que se faça justiça.
Vamos ser sérios.
Vamos ser solidários. Vamos lutar por uma Escola Decente.
Ps: Este caso já
foi participado na Polícia e seguirá para
Tribunal.
Ermesinde, 30 de
Março de 2010
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