O pacote contém também “elegantes rótulos” que certificam que os recipientes de vidro contêm “barolo” [designação de origem de vinho produzido na região vinícola do Piemonte, Itália]. Barolo, mas em pó. Um nome sem nenhuma relação com as suas origens, ao ponto de poder-se mesmo “degustar” barolo branco.
Luca Zaia, o ministro [italiano] da Agricultura, arrumou-o muito apropriadamente naquilo a que chama “a galeria dos horrores”: um monte de “trafulhices” declaradas conformes às normas europeias e que desafiam a paciência do consumidor italiano. A Coldiretti [poderosa federação de empresas agrícolas] improvisou uma mini-exposição destes “monstros” num grande hotel de Bruxelas: queijos sem leite, produtos de agricultura biológica contaminados com OGM, frangos apátridas, laranjada sem laranja… “Todas as coisas que se encontram, sem darmos por isso, no cesto da dona de casa”, argumenta Sergio Marini, presidente da organização de agricultores. “As grandes superfícies angariam lucros jogando com a ambiguidade da informação.”
No Tribunal Europeu, essa grande co-propriedade onde os intervenientes são cada vez mais numerosos, a tendência actual – fazer passar os interesses nacionais à frente dos interesses europeus – parece não ter limites. Vinho sem uva? Na Alemanha e noutros países do norte, há vários anos que se vindimam maçãs, framboesas e groselhas pretas. Nos seus mercados internos, chamam-lhe “vinho” e bateram-se para continuar a produzi-lo e até vendê-lo no estrangeiro. A Itália opôs-se, mas teve depois de resignar-se inapelavelmente ao voto maioritário que, sobre numerosas questões agrícolas, se produz por uma maioria milimétrica, de 14 (Estados da Europa do Norte e do Leste) contra 13 (países mediterrânicos e seus vizinhos). Permanece a esperança de que os consumidores identifiquem os rótulos e não se deixem confundir. A Coldiretti e o ministro não parecem convencidos disso.
No Conselho da Europa de Bruxelas são os lobbys mais fortes que levam a melhor: Alemanha, França, Escandinávia. Quase nunca é a Itália, que tem uma agricultura bastante melhor, tanto pela sua qualidade como pelas suas tradições e níveis de preços. Berlim defende com unhas e dentes as suas grandes criações e as suas imensas superfícies agrícolas. Os nossos agricultores dispõem de superfícies reduzidas e a cultura dos direitos, na Europa, é ainda uma ciência jovem, ainda presa à maldição que, na década de 1980, levou o Governo a fazer o mau negócio das quotas leiteiras em troca de apoios à siderurgia. Viu-se o resultado.
Marini quer que não se dêem tréguas a Bruxelas, para nos protegermos de ciladas. Como, por exemplo, as que se escondem por trás da abolição dos padrões e calibres mínimos para fruta e legumes, sob pena de termos no mercado produtos de refugo a preços incontroláveis. Ou ainda contra a autorização, em vigor desde Janeiro, de acrescentar até 10% de caseína no fabrico de queijos. E tem toda a razão. Mas isto não deve fazer esquecer o que a Europa fez pela nossa economia verde, a começar pela protecção das denominações controladas. No dia 1 de Julho próximo, vai chegar a classificação D.O.C para o azeite de qualidade de origens geográficas protegidas. Para os produtores, é uma vitória. A União Europeia, como todas as co-propriedades, mostra ora o verso ora o reverso da medalha.